Pequenos e charmosos copos de vidro ou taças, com montagens e decorações impecáveis, têm dado destaque a doces e sobremesas em mesas de festa e casamentos. As verrines, de origem francesa, não são receitas, e sim uma forma de servir as preparações em recipientes de vidro.
Conta-se que o chef e pâtissier francês Philippe Conticini, em 1994, teria sido o responsável pela introdução desse modo servir, transpondo as receitas tradicionalmente servidas planas (em pratos, apresentação clássica) para a forma vertical e transparente. A palavra verrine vem de verre, vidro, em francês.
O chef francês, que também criou a patisserie des rêves (confeitaria de sonhos) e é detentor de estrelas Michelin (uma das mais valorizadas distinções da gastronomia mundial), defende que essa é uma maneira de ele transmitir emoções. Conticini afirma que a verrine permite controlar as sensações que os clientes sentem ao degustar e, assim, transmitir a própria leitura de sabores do pâtissier.
A carga afetiva de uma sobremesa é imensa, traz de volta à memória momentos e receitas que carregam história e marcaram ao longo da vida. São momentos especiais, de comemoração, de alento por uma tristeza, de “casa de vó”, “de doce de mãe”, de agrado. São geralmente conectados ao feminino, literalmente, doces lembranças.
As verrines, com apresentação em pequenas porções, são uma evolução de sobremesas antigas, servidas em taças grandes, como o Pêssego Melba, a Coupe Danmark e outros doces que tinham como base sorvetes. Embora bonitas e gostosas, naquela época, eram sobremesas enormes e muito calóricas, quase sempre acompanhadas por uma base de sorvete. Hoje, não apresentam mais sorvetes em suas bases, o tamanho da sobremesa foi reduzido. Houve ganhos na diversificação das texturas e sabores, trazendo leveza e diminuindo as calorias.
A chef e banqueteira Flavinha Mello conta que as verrines tomaram conta das mesas de festas, principalmente em casamentos e formaturas. Os menus tradicionais de canapés, entrada, prato principal e sobremesa empratada deram lugar a mesas de antepastos (que podem incluir verrines salgadas), prato principal e mesa de sobremesas, com um misto de apresentações com doces clássicos e modernos, como as verrines. “É uma questão de praticidade, de apresentação e de poder oferecer diferentes opções para os convidados, que podem escolher mais de uma sobremesa, uma vez que são pequenas porções”, destaca.
Em uma mesa de doces tradicional, apesar de alguns detalhes, são todos muito parecidos e não há como saber qual o recheio a não ser provando de um por um. Em festas de casamento, 15 anos ou formaturas, a tendência agora são os doces abertos, que seguem a mesma lógica do naked cake – no qual as camadas da massa, recheio e cobertura ficam mais visíveis. E é aí que as verrines fazem sucesso.
Apesar de alguns denominarem verrines doces como brigadeiro ou outros de sabores únicos, servidos em copinhos ou taças, as verdadeiras apresentações que levam esse nome devem ter camadas de sabores diversos. Mesmo que o ideal sejam três camadas, duas também são aceitas, ainda mais se tiverem uma decoração no topo, em lugar da terceira.
Transparência e verticalidade permitem identificar visualmente a sobremesa e analisar a construção. Porém, a disposição em camadas ultrapassa a questão estética e garante também o equilíbrio entre os sabores da receita em todas as colheradas.
A confeiteira e professora de Gastronomia Sharisy Lauxen tem acompanhado essa tendência e ressalta a delicadeza da apresentação, o que por si só é um atrativo. Por isso, para quem pretende montar uma verrine, recomenda que utilize saco de confeitar, evitando assim sujar as bordas do recipiente, mantendo as camadas bem delimitadas. E destaca a importância da forma de comer a sobremesa. “A colher deve ir até o fundo do recipiente para que as camadas possam ser degustadas simultaneamente.”
Dicas de Sharisy
- As camadas devem ser bem definidas, visualmente separadas e iguais em todas as verrines.
- O ideal é que a verrine tenha, no mínimo, 3 texturas: crocante, aerada e cremosa.
- O crocante pode ser massa sablé, biscoito, bolo, massa folhada, brioche, nibs ou castanhas.
- Se utilizar frutas, elas devem estar em forma de compota, geleia ou coulis.
- As frutas in natura costumam soltar líquido e têm pouca durabilidade.
- Os cremes devem ser aveludados.
- Cremes muito espessos podem dificultar a separação em camadas.
- A camada aerada pode ser composta por uma mousse.
- As caldas não devem ser muito líquidas, para evitar que se misturem às demais camadas.
- Essas caldas podem ser: caramelo, chocolate ou de frutas.
- O recomendável é que os sabores sejam delicados e as texturas leves.
- As porções não devem chegar até a borda dos copos ou taças, e sim 1 ou 2 dedos abaixo.
Dicas de Flavinha
- Para uma festa com duração prevista de 4h a 5h, calcule 5 verrines por pessoa.
- Para festa mais longas, como um casamento, que pode durar até 8h, o ideal é de 6 a 8 verrines.
- Se forem comtemplados outros doces, inclua-os no cálculo de quantidades.
- Utilize copos e/ou taças diferentes para cada tipo de sobremesa.
- Para festas ou eventos menores, fica charmoso utilizar copos e taças antigos, garimpados em briques ou herdados da família. Nesse caso, podem conter a mesma sobremesa.
- A apresentação em verrines é perfeita para eventos com menu volante, facilita para os convidados, que não precisam formar filas para se servir, e para os garçons, que podem recolher facilmente os recipientes.
Saiba mais
- As verrines podem ser doces ou salgadas.
- Patisserie des Rêves surgiu com o intuito de trazer de volta as memórias gustativas da infância, doces que eram lembranças únicas.
- O chef Philippe Contini e o sócio, Thierry Teyssler, são proprietários da confeitaria Patisserie des Rêves, em Paris, onde é possível encontrar clássicos da confeitaria francesa que fizeram, e fazem, parte do dia a dia de qualquer criança na França.
- Pêssego Melba é uma sobremesa de pêssegos e calda de framboesa com sorvete de baunilha. Foi criada, entre 1892 e 1893, pelo chef francês Auguste Escoffier, no Hotel Savoy, em Londres, para homenagear a soprano australiana Nellie Melba.
- A Coupe Danmark, em inglês Dame Blanche, é o nome usado na Bélgica e na Holanda para uma sobremesa composta por sorvete de baunilha com chantilly e chocolate derretido quente.
Receita
Panacota com Calda de Quentão
Por Flavinha Mello
Ingredientes
- PANACOTA
- 600 ml de creme de leite fresco
- 150 ml de leite
- 2 folhas de gelatina
- 100 ml de mel
- 1 fava de baunilha ou 1 colher (café) de extrato de baunilha
- CALDA DE QUENTÃO
- 1 1/3 xícara de açúcar
- ½ xícara de água filtrada
- 180 ml de vinho
- casca de 1 laranja
- casca de 1 limão
- 2 paus de canela
- 5 cravos-da-índia
Modo de Fazer
PANACOTA: Quebre a gelatina em pedaços pequenos, em recipiente separado. Junte 4 colheres (sopa) de água fria para dissolver. Raspe com uma faca a fava da baunilha, retirando as sementinhas, e reserve. Numa panela, coloque o leite, o creme de leite, o mel e a baunilha com a fava (ou o
extrato) e misture. Aqueça em fogo baixo e mexa até o creme chegar à temperatura de 80 graus ou quase ferver. Remova do fogo e retire a fava.
Espere esfriar e misture com a gelatina. Coloque na geladeira por aproximadamente 5 horas.
CALDA: Em uma panela grande, adicione água e açúcar e misture até que o açúcar se dissolva na água. Leve a mistura de água com açúcar ao fogo e cozinhe em fogo médio-alto com as especiarias. Primeiro, começará a borbulhar nas bordas ou em apenas alguns pontos ao redor da panela. Logo, toda a superfície ferverá e o açúcar passará de opaco para claro, adicione o vinho e mexa até incorporar. Retire do fogo e deixe esfriar.
SAIBA MAIS
- Panacota ou panna cotta, em italiano, significada nata cozida. É uma sobremesa típica da região de Piemonte, elaborada a partir de nata do leite (creme de leite), açúcar, gelatina e especiarias.
- Deve ser servida fria ou gelada, guarnecida com compotas, calda de frutas ou pedaços de frutas frescas ou de chocolate.
Receita
Verrine de Mascarpone e Frutas Amarelas
Por Sharisy Lauxen
Ingredientes
- Biscoito champanhe
- CREME
- 140 g de gemas
- 80 g de açúcar
- 30 ml de água
- 500 g de mascarpone
- COMPOTA DE FRUTAS AMARELAS
- 1 maracujá
- 1 limão
- 300 g de manga em cubinhos
- 100 g de açúcar
- 2 g de pectina
- 1 fava de baunilha
- DECORAÇÃO
- Suspiros
- Flores comestíveis
- Chantilly
Modo de Fazer
CREME: Na batedeira, bata as gemas até que dobre de volume. Em uma panela, junte a água e o açúcar e faça uma calda a 121 graus. Verta a calda sobre as gemas na batedeira e bata até que a mistura esteja fria. À parte, bata o mascarpone até que atinja a consistência de chantilly. Junte ao creme de gemas e misture. Reserve.
COMPOTA: Em uma panela, junte os cubos de manga, a polpa do maracujá, o suco de limão e a fava de baunilha, leve ao fogo e deixe cozinhar por 3 min.
MONTAGEM: Monte as verrines intercalando camadas de creme de mascarpone com o biscoito champanhe umedecido. Por cima, distribua a compota de frutas amarelas. O doce ainda pode ser decorado com suspiros, flores comestíveis e chantilly.
Receita
Rei Alberto
Por Flavinha Mello
Ingredientes
- GELATINA
- 2 caixas de gelatina de morango
- 2 xícaras de água quente
- 1 xícara de água fria
- 4 claras
- 8 colheres (sopa) de açúcar
- 1 lata grande de abacaxi em calda
- CREME CONFEITEIRO
- 2 xícaras de leite
- 3 gemas
- ½ xícara de amido de milho
- ¾ de xícara de açúcar
- 1 colher (chá) de essência de baunilha ou extrato de baunilha
- MERENGUE
- 3 claras
5 colheres (sopa) de açúcar - CALDA DE AMEIXAS
- 200 g de ameixas secas sem caroço
- 3 xícaras de açúcar
- 3 xícaras de água
Modo de Fazer
CREME CONFEITEIRO: Em uma panela, ferva o leite. Em uma tigela, bata as gemas e o açúcar até ficar um creme claro. Acrescente o amido de milho e continue batendo até integrá-los. A seguir, despeje 1/3 do leite sobre a preparação de gemas. Mexa bem e passe tudo para a panela que contém o restante do leite. Em fogo baixo e sem parar de mexer, aqueça o creme até ferver. Continue mexendo enquanto cozinha por mais alguns minutos. Retire do fogo, junte a essência de baunilha e misture bem. Cubra a superfície com filme plástico, em contato direto com o creme, e deixe esfriar. Leve à geladeira.
GELATINA: Dilua a gelatina na água morna em uma tigela. Adicione a água fria e 1/2 xícara da calda da compota de abacaxi. Reserve. Bata as claras na batedeira e junte o açúcar aos poucos até formar um merengue. Misture a gelatina com o merengue, mexendo bem. Coloque o abacaxi picado no fundo das verrines e despeje o creme por cima. Deixe fora da geladeira até a gelatina separar em uma camada vermelha e outra rosa. Leve à geladeira 4 horas, para firmar.
MERENGUE: Em uma panela, coloque as claras e o açúcar e leve ao fogo baixo, batendo com um fouet até que essa mistura esteja ligeiramente quente, mas sem que chegue a cozinhar. Transfira a mistura para a batedeira e bata até que esteja completamente frio. O ponto ideal é quando o creme ficar firme e cremoso, sem escorrer.
CALDA DE AMEIXA: Em uma panela, leve ao fogo as ameixas com o açúcar e água. Deixe ferver até que forme uma calda em ponto de fio. Desligue o fogo e deixe esfriar.
MONTAGEM: Retire o creme de confeiteiro da geladeira e bata com um fouet para que fique mais liso e macio. Sobre a gelatina já firme, faça uma camada com o
creme de confeiteiro. Sobre o creme, construa uma camada fina de merengue. Leve à geladeira até o momento de servir. Quando for servir, decore com as ameixas.
SAIBA MAIS
- A sobremesa Rei Alberto é uma homenagem ao rei Alberto I, da Bélgica, que esteve em visita ao Brasil em 1920.
- Conta-se que foi servida ao rei e a sua esposa, rainha Elisabeth, em um majestoso banquete com cardápio francês no Palácio da Liberdade, em Belo Horizonte, durante a visita dos soberanos. Na época, foi apresentada como dessert brésilien (doce brasileiro), só mais tarde recebendo o nome do rei.
- A receita original tem três camadas, cujas cores lembram a bandeira da Bélgica: vermelha (gelatina de morango com pedaços de abacaxi em calda), preta (purê de ameixas) e amarela (doce de ovos).
- Com o passar do tempo, os ingredientes foram se modificando e a sobremesa passou a receber também uma camada de merengue, e, em alguns casos, o doce de ovos substituído por creme de confeiteiro.
- É um doce muito tradicional no Rio Grande do Sul, e foi um dos prediletos de dois ex-presidentes da República gaúchos: Getúlio Vargas e Emílio Garrastazu Médice.
Receita
Pavê Bicolor
Por Sharisy Lauxen
Ingredientes
- Biscoito maisena
- Leite
- CREME BRANCO
- 1 lata de leite condensado
- 1 medida da lata de leite
- 2 gemas
- 2 colheres (sopa) de maisena
- CREME PRETO
- 1 lata de leite condensado
- 3 colheres (sopa) de chocolate em pó
- 1 colher (sopa) de manteiga
- 1 caixinha de creme de leite
- DECORAÇÃO
- raspas de chocolate
Modo de Fazer
CREME BRANCO: Em uma panela, leve ao fogo o leite condensado, as gemas, a maisena dissolvida no leite, mexendo até que forma um creme espesso. Reserve.
CREME PRETO: Em uma panela, junte o leite condensado, a manteiga e o chocolate em pó. Misture até que fique na consistência de brigadeiro. Adicione o creme de leite e misture bem.
MONTAGEM: Nas verrines, distribua primeiro o creme branco. Faça a próxima camada com o biscoito umedecido do leite. A seguir, faça a camada de creme preto. Decore com raspas de chocolate.
SAIBA MAIS
- O biscoito maisena pode ser branco ou de chocolate.
- O biscoito deve ser só levemente umedecido, para que não perca a textura.
- Na literatura francesa, os pavês, servidos em travessas de vidro, também são considerados verrines.
- O nome pavê vem do francês pavage (pavimento), por ser montado em camadas, assim como as verrines.