Em minha recente viagem em torno do mar Egeu acompanhando a expedição cultural StudioClioTur by TripTravel exploramos os principais sítios arqueológicos na costa da Turquia, onde na Antiguidade se desenvolveu o pensamento clássico ocidental. Ao longo de três semanas visitamos os vários sítios arqueológicos, Patrimônio da Humanidade pela Unesco, onde viveram pensadores e poetas, entre os mais significativos do mundo grego. No roteiro, elaborado pelo historiador e arqueólogo Francisco Marshall, percorremos as marcas arqueológicas nos locais onde floresceram diferentes escolas do pensamento ao longo de meio milênio, do século VII ao III a.C., dos primórdios ao ápice da filosofia na Antiguidade grega.
Nesta expedição acabamos fazendo um curso completo de filosofia e cultura grega, na prática e “in loco”. Percorrendo cenários onde viveram e refletiram os pensadores clássicos, seus conceitos e ideias fundamentais. Diariamente o professor Marshall nos compartilhava,
a partir de fontes primárias, os comentários e visões de mundo dos grandes pensadores, imersos todos naquele cenário inspirador – ontem e hoje.
Nossa primeira parada foi em Mileto, cidade-estado situada junto à foz do rio Meandro. Um porto próspero com comércio ativo entre o Oriente e Ocidente, estabelecendo centros comerciais tanto no Egito como na península Itálica. Considerado o mais antigo e o mais importante dos assentamentos jônios, prosperou por mais de um milénio a partir de 700 a.C., sendo uma das primeiras cidades do mundo antigo a cunhar moedas e cuja qualidade da lã era renomada em todo mundo grego.
Tales de Mileto (625-558 a.C.) é o mais famoso cidadão desta pólis,
foi um filósofo pré-socrático, astrônomo e matemático. Fundador da Escola Jônica, é considerado o pai da filosofia. A prosperidade econômica e cultural proporcionou a continuidade e aprimoramento de seu pensamento com Anaximandro, Anaxímenes, Leucipo, Hecateu e Hipódamo.
A cidade foi destruída pelos persas, reconstruída por Alexandre, o Grande, ampliada durante o período helenístico e romano. O assoreamento do rio Meandro levou a sua decadência comercial e abandono. Nas ruínas desta outrora próspera cidade portuária revisitamos as ideias desses mestres – uma viagem por dois séculos do desenvolvimento do pensamento grego, enquanto percorríamos o seu teatro, ágora e banhos romanos.
Mileto foi destruída pelos persas e
reconstruída por Alexandre, o Grande
Já em Didyma visitamos as ruínas monumentais do templo oracular de Apolo, no burgo em que nasceu uma das mulheres mais notáveis do mundo antigo, Aspásia – cuja inteligência teria influenciado Sócrates e Péricles, os mais importantes filósofos e políticos de seu tempo.
Terminamos o dia em Priene, que já foi uma cidade portuária, mas agora está localizada a 16 km do mar, na encosta do Monte Mykale. Priene é um dos melhores exemplos do urbanismo clássico, de Hipódamos de Mileto, com sua estrutura ortogonal de quarteirões e serviços planificados. Destacam-se as excelentes ruínas do teatro e do Templo de Palas Atena, com vista para o vale do rio Meandro.
No dia seguinte visitamos Éfeso, um dos mais célebres sítios arqueológicos clássicos, com uma das 7 maravilhas do mundo antigo – o templo de Ártemis, em que o filósofo Heráclito depositou seu livro de aforismos. A estátua da Deusa encontra-se no museu local, que sempre recomendo visitar para complementar com os detalhes a compreensão do conjunto. Havia estado neste sítio há quase 3 décadas, quando ainda não havia sido escavada a área de “villae” romanas; com seus mosaicos e espaços residenciais, constitui uma verdadeira “Pompéia Turca”. Mas lembrava bem das belas ruínas da biblioteca de Celsus, do período áureo do Império Romano, com impressionante estatuária, ornamentos e inscrições. Efesus, como Mileto, foi próspera no período clássico e devastada nas guerras greco-pérsicas. Foi reconstruída por um dos generais de Alexandre, o Grande. Ampliada nos períodos helenístico e romano, como atesta o seu teatro, um dos maiores e mais bem preservados. Efesus chegou a ser o maior porto do Império Romano no Mediterrâneo Oriental. Como Mileto, perde sua função de porto com o assoreamento do rio, e posteriores ataques e terremotos levam ao abandono da cidade, resgatada pela arqueologia no final do século XIX e hoje patrimônio da humanidade pela Unesco.
Incluímos na programação as ruínas de Nysa, que eu não conhecia e que estiveram fechadas para restauração por vários anos, recentemente reabertas. Conforme íamos atravessando o percurso de 90 minutos, a partir de Éfeso, por entre montanhas e vales do rio Meandro, mergulhávamos dois mil anos no tempo. Como primeiro grupo brasileiro no sitio arqueológico, e os únicos visitantes naquele dia, tínhamos o belíssimo teatro da época helenística todo para nós. Nosso mestre Marshall, por meio de sua fala, nos fez imaginar como parte de uma encenação de tragédia grega, com todos os elementos que o sítio único proporcionava. Brindamos com vinho local o deus Dioniso, no local onde se acredita que o mito surgiu. Adorei ser surpreendido, o que é cada vez mais difícil pela facilidade de acesso que temos a qualquer informação, e que só experiências únicas e novas como essa proporcionam.
Outra novidade para mim seria Pergamo, a 26 quilômetros da costa do mar Egeu, no alto de um promontório. Durante o período helenístico, foi a capital do Reino de Pérgamo e um dos principais centros culturais do mundo grego. A sua acrópole abriga ruínas de extraordinária beleza, como o Templo de Trajano, do século II d.C., com suas colunas de mármore de ordem coríntia, dedicado ao imperador Trajano por seu sucessor, Adriano. O “highlight” fica com o dramático teatro de Dioniso, nas encostas íngrimes da montanha, com ampla vista do vale abaixo. Já para conferir o Altar de Zeus (180–160 BC), com seu friso em relevo retratando os deuses do Olimpo em batalha contra os gigantes, é preciso ir ao Pergamon Museum, em Berlim, para onde essa obra-prima da arte helenística foi levada no final do século XIX. No vale aos pés da acrópole nos encantamos também com o Asclepieion, santuário médico onde a arqueologia ilustra muitas das terapias antigas.
Seguimos depois para Assos, cidade em que viveu Aristóteles, o maior filósofo da História. Nascido em Estagira, na Macedônia, aos 17 anos se muda para Atenas para estudar na Academia de Platão, onde por duas décadas desenvolveu os conhecimentos de geometria, física, astronomia, filosofia, oratória…
Por ocasião do processo de sucessão da Academia, da qual foi relegado, Aristóteles rompe com Platão e parte em 347 a.C. para Assos, a convite de um colega da Academia que virara o soberano local. Em Assos permanece três anos muito produtivos, onde aprimora sua compreensão do mundo, substituindo o método dialético de Platão pelo argumento dedutivo com maior valor didático, sistema base de todas as ciências. Enquanto percorríamos a Acrópole com as ruínas do templo de Atena e seu teatro, o helenista Francisco Marshall nos relembrava da importância do pensamento de Aristóteles de compreensão empírica e analítica do mundo, e do vigor racional pela inteligência lógica, que formaram a base de todas as ciências.
Terminamos nossa expedição em Troia, uma das descobertas máximas da história da arqueologia, testemunho de séculos de ocupações e reocupações no sítio imortalizado na Ilíada de Homero, em torno da guerra ocorrida por volta de 1.154 a.C. Nos anos 1870 o arqueólogo alemão Heinrich Schliemann escavou a área, o que revelou que oito cidades foram construídas ao longo de quase 2 milênios no mesmo local. A cidade de Troia sofreu não só com a invasão dos gregos micênicos, mas também com os deslocamentos dos jônicos, cimérios, frígios, milésimos, lídios e os persas. Na época do Império Romano, o imperador Augusto fundou uma nova cidade no lugar de Troia, que se desenvolveu até o estabelecimento de Constantinopla.
Esse tipo de viagem pela história, arqueologia e filosofia me proporcionou compor as peças do grande quebra-cabeça da Antiguidade grega. Muito instigante! Recomendo!
Em maio de 2024, o StudioClioTur by TripTravel vai desvendar o mundo romano no norte da África, em uma fascinante viagem entre Roma e Tunísia. Mais informações pelo beto@triptravel.com.br ou (51) 993140587.