O rum já foi a bebida preferida dos piratas do Caribe, moeda de troca por escravos africanos, sucesso em drinks nos anos 1930 e voltou a movimentar bares e festas nos anos 1970. Agora, na versão Premium, ganha novamente destaque e começa a desbancar, na Europa e nos Estados Unidos, o até então queridinho gin, superando suas vendas, com um crescimento de 165%.
O sommelier Vinícius Santiago, diretor da Associação Brasileira de Sommeliers do Rio Grande do Sul, analisa que essa tendência segue o que aconteceu com o uísque alguns anos atrás. Está baseada principalmente em produtos premium e por uma proposta de colecionismo. “Muitos consumidores querem ter garrafas específicas de produtos em seu bar. Seguindo a tendência internacional da coquetelaria, também tem aumentado o consumo dos Spiced Rum, saborizados com especiarias”, afirma.
O que tem realmente motivado o enorme aumento de vendas no segmento dos runs premium é a sua polivalência. Rafael Nardi, do projeto chamado Barman de Apartamento, que faz workshops sobre drinks, diz que um dos motivos para o aumento do consumo de rum é a sua versatilidade em coquetéis: “É um destilado com mais presença do que a vodca, por exemplo, mas ainda assim muito mais amigável do que os outros destilados envelhecidos, como o uísque escocês ou o Bourbon”.
De origem controversa, há quem garanta que o rum teria surgido na colônia de São Domingos, na América Central, no século 16, durante a colonização espanhola. A seguir, os povos das ilhas do Caribe, Cuba, Jamaica, Porto Rico e Guianas o teriam conhecido e adotado. Nas Antilhas, colonos ingleses e franceses teriam difundido largamente a bebida e a aprimorado. A bebida pode ser feita de duas formas diferentes: a agrícola e a industrial. A primeira é obtida diretamente do caldo de cana fermentado, e a segunda é a partir do melaço. A destilação pode ser feita em alambique ou em coluna de destilação.
O rum é derivado da cana-de-açúcar, planta que se adaptou muito bem às condições climáticas das Antilhas. Atualmente, no mercado se destacam as produções da Jamaica, República Dominicana, Venezuela, Guatemala e Barbados. As ex-colônias francesas produzem o Rum Agricole, destilado do mosto de cana e não do melaço, similar à cachaça brasileira.
Na Europa e EUA as vendas de rum tiveram um crescimento
de 165%, especialmente os produtos tipo premium
Como escolher
Aos iniciantes na arte de apreciar a bebida, o sommelier Vini Santiago afirma que, na hora de escolher, o melhor é começar com os dois estilos básicos para coquetelaria: um rum leve não envelhecido e um Gold envelhecido, que podem ser utilizados para inúmeros preparos. “Para os que preferem desfrutar a bebida pura, o ideal são os envelhecidos longamente em carvalho, às vezes chamados de Dark Rum, que ganham complexidade e textura”, recomenda.
Tipos
Rafael Nardi destaca que, normalmente, se classifica o rum como claro ou escuro, mas isso não chega perto de descrever as variações de perfil sensorial que ele traz. Os mais leves, normalmente feitos em países que foram colônias espanholas, são perfeitos para coquetéis sour como o Daiquiri, mas também são excelentes se usados como mixers. Os no estilo britânico, mais pesados e encorpados, são utilizados em coquetéis clássicos, como um Old Fashioned. Mas o rum envelhecido também é muito apreciado para se tomar puro, como um bom uísque.
Branco – Conhecido como rum prata, é filtrado até perder a cor. Não costuma passar por envelhecimento. Tem doçura suave e é indicado para a coquetelaria. Ideal para produzir drinks, como Mojito e Daiquiri.
Dourado – Tem coloração âmbar e sabor mais amadeirado, mais complexo e mais marcante, com notas sutis de baunilha e castanhas. Conhecido como rum ouro, pode ser usado em drinks.
Escuro – Apresenta cor mais intensa, por envelhecer em barris de carvalho tostado. Tem notas de caramelo. É uma ótima opção para integrar sobremesas e mais apreciado por quem gosta de consumir puro ou com gelo.
Spiced – Leva especiarias, como pimenta e canela, e é produzido no Caribe. Pode ser feito tanto com o rum branco quanto com o dourado.
Saborizado – Costuma levar infusões ou aromatizantes de especiarias, ervas e frutas. Se assemelha a coquetéis, com sabor mais adocicado, e apresenta teor alcoólico mais leve. Uma boa escolha para incrementar drinks ou ser bebido puro.
Premium – Passa mais tempo em madeira de qualidade, ganhando notas de chocolate, café e tabaco. Ideal para consumir puro ou com gelo. Em alguns drinks, pode substituir o uísque.
Variedades
Aromático – Originário da Indonésia, além do melaço de cana inclui grãos de arroz vermelho.
Cubano – Leve e suave, com teor alcoólico de 40 graus. Pode ter coloração transparente, ideal para coquetéis, ou dourada.
Da Martinica – Encorpado, é feito com suco de cana em lugar de melaço.
De Barbados – De ótima qualidade. Apresenta leveza e sabor acentuado.
Encorpado – Escuro, tem corpo e aromas marcantes. É originário da Jamaica, Martinica e Barbados.
Jamaicano – É o mais forte de todos. Tem teor alcoólico de quase 76 graus. É geralmente exportado para a Inglaterra, onde é envelhecido em tonéis de carvalho por muitos anos. Costumam ser duplamente destilados.
Navy – Produzido na Guiana e em Trinidad e Tobago, é um dos mais encorpados.
Porto Riquenho – Um dos mais famosos. É leve e com muita qualidade.
Se destacam no mercado as produções de rum da Jamaica,
República Dominicana, Venezuela, Guatemala e Barbados
Harmonização
O rum pode ser versátil em harmonizações. O sommelier Vini Santiago explica que geralmente os claros e leves, puros ou em coquetéis, como o Mojito, harmonizam bem com saladas, peixes e frutos do mar. Os envelhecidos combinam com caramelização na gastronomia, pratos agridoces e chocolates. Nozes caramelizadas, abacaxis grelhados e costelinha com molho barbecue são ótimas opções. Podem ser ingredientes em receitas como sorvete com passas ao rum, Tiramisu (perfeito com o toque de café), Baba ao Rum (bolo tradicional napolitano, embebida no rum) e em musses ou brigadeiros de chocolate. A bebida também pode ser utilizada pra flambar. “Ainda vale lembrar a combinação clássica entre rum e charutos”, destaca.
Na coquetelaria
O rum é a base de diferentes drinks clássicos, como o Mojito, o Daiquiri, a Cuba Libre (Coca-Cola, suco de limão) e a Piña Colada (abacaxi, leite de coco), que fizeram a fama da bebida no passado e que estão retornando aos bares. O escritor americano Ernest Hemingway, que viveu 20 anos em Cuba, contribuiu em muito para a divulgação do Mojito e do Daiquiri ao incluí-los em suas obras. Uma frase conhecida de Hemingway é: “Mi Mojito na Bodeguita, mi Daiquiri na Floridita”.
Até um passado recente os coquetéis eram vistos como bebida feminina, adocicada, o que afastava os homens. Mixologistas e bartenders de todo o mundo, no entanto, têm criado drinks, alguns à base de rum, com combinações de variados ingredientes e que passaram a atender diferentes gostos.
O chef Carlos Kristensen, do Hashi, tem acompanhado essa evolução e modernizado a carta de coquetéis do seu restaurante com a colaboração do bartender Rafael Nardi. “Estou descobrindo esse mundo dos coquetéis. Nossa carta conta agora, entre outros, com o Mai Tai”, conta. Em breve, o chef estará lançando um menu especial harmonizado com coquetéis. Cada prato com um coquetel diferente.
O rum é a base de diferentes drinks clássicos,
como o Mojito, o Daiquiri, a Cuba Libre e a
Piña Colada, que estão retornando aos bares
Mojito
Conta-se que o almirante inglês Francis Drake ancorou o navio em Havana, Cuba, no século 16, junto com o irmão Richard. Em uma noite de festa, Richard misturou aguardente, suco de lima e hortelã e deu o nome ao drink de Drake, como uma auto homenagem. Francis, então, teria criado outra versão com rum, lima e limão, que chamou de Mojito. A palavra é diminutivo de mojo, palavra do folclore das culturas afro-americanas, que significa encanto e feitiço. Conta-se que Ernest Hemingway costumava sentar-se todas as noites no La Bodeguita del Medio para tomar o Mojito antes de ir jantar nos restaurantes cubanos.
Receita
MOJITO
Rafael Nardi
Ingredientes
- 60 ml de rum branco
- 22 ml de suco de limão fresco
- 22 ml de xarope de açúcar
- 30 ml de água com gás
- De 10 a12 folhas de hortelã
Xarope de açúcar - 250 g de açúcar refinado
- 250 ml de água filtrada
Modo de Fazer
Mojito: Em um copo alto, acrescente as folhas de hortelã e aperte levemente. Adicione bastante gelo e acrescente os ingredientes (exceto a água). Misture por aproximadamente 8 segundos e adicione a água com gás. Misture novamente e adicione mais gelo, se necessário. Decore com uma fatia de limão e um ramo de hortelã.
Xarope: Meça/pese os ingredientes. Acrescente a água em uma panela e leve à fervura em fogo médio. Adicione o açúcar e mexa até diluir por completo. Quando ferver, desligue. Aguarde esfriar em temperatura ambiente. Leve para gelar. Mantenha sempre refrigerado. Na geladeira, dura 15 dias.
Daiquiri
O drink teria sido inventado, no início do século 20, pelo mineiro americano Jennings Cox, numa praia próxima a Santiago de Cuba. A bebida conquistou também os membros da Marinha americana. E foi o almirante Lucius Johnson que levou o Daiquiri para os Estados unidos. O drink conquistou John F. Kennedy e o escritor Ernest Hemingway . Em Cuba, Hemingway ganhou o apelido de Papa. Diz-se que depois de provar o primeiro Daiquiri no La Floridita comentou que teria preferido com dose dupla de rum e menos açúcar. A dose de rum foi dobrada e o açúcar foi substituído por suco de grapefruit, chamado de Papa Doble. Diz-se também que Ernest Hemingway amava tanto essa versão do coquetel que conseguia beber até 17 seguidos.
Receita
DAIQUIRI
Rafael Nardi
Ingredientes
- 60 ml de rum branco
- 22 ml de suco de limão taiti
- 22 ml de xarope de açúcar
- Xarope de açúcar
- 250 g de açúcar refinado
- 250 ml de água filtrada
Modo de Fazer
Daiquiri: Separe uma taça coupé ou Martini e adicione gelo para refrigerá-la. Em uma coqueteleira, acrescente os ingredientes. Adicione bastante gelo e bata a receita por aproximadamente 10 segundos. Retire o gelo da taça. Com auxílio de um coador e de uma peneira, faça coagem dupla do coquetel. Sirva na taça e decore com uma fatia de limão.
Xarope: Meça/pese os ingredientes. Acrescente a água em uma panela e leve à fervura em fogo médio. Adicione o açúcar e mexa até diluir por completo. Quando ferver, desligue. Aguarde esfriar em temperatura ambiente. Leve para gelar. Mantenha sempre refrigerado. Na geladeira, dura 15 dias.
Mai Tai
O coquetel foi criado por Victor Jules Bergeron, o Trader Vic, dono de um restaurante em Oakland, São Francisco, especializado em comida da Polinésia. Em 1944, teria testado uma nova receita de coquetel com dois amigos do Taiti, Ham e Carrie Guild. Após o primeiro gole, Carrie teria exclamado “mai-tai-roe”, que significa “fora deste mundo – o melhor”. Trader batizou o drink de Mai Tai.
O Mai Tai está entre os chamados coquetéis Tiki, que significa algo como “ser humano”, na língua ancestral dos povos que habitam as ilhas do Pacífico. Com sabores exóticos, decoração com muitas frutas, refrescante, cítrico, potente e com camadas de sabores e motivos tropicais inspirados na cultura da Polinésia. Tem como base rum e licor de laranja, xarope de amêndoas, cítricos (limão, laranja, abacaxi) e hortelã.
Receita
MAI TAI
Rafael Nardi
Ingredientes
- 60 ml de rum envelhecido
- 15 ml de Triple Sec (licor de laranja)
- 22 ml de suco de limão taiti
- 15 ml de xarope de amêndoas
- Hortelã para decorar
Xarope de Amêndoas - 2 xicaras de açúcar
- 1 xícara de leite de amêndoas
- ½ colher (chá) de água de flor de laranjeira (opcional)
Modo de Fazer
Mai Tai: Separe um copo baixo e adicione gelo para refrigerá-lo. Na coqueteleira, acrescente os ingredientes. Adicione bastante gelo e bata a receita por aproximadamente 10 segundos. Retire o gelo do copo e adicione um novo gelo sólido. Com auxílio de um coador e de uma peneira, faça coagem dupla do coquetel. Sirva no copo e decore com uma fatia de limão e um ramo de hortelã.
Xarope de Amêndoas: Misture o leite de amêndoas e o açúcar em uma panela em fogo baixo até o açúcar dissolver. Acrescente a água de flor de laranjeira e armazene em uma garrafa esterilizada. Conserve em geladeira por um mês.
Chet Baker
O drink foi criado por Sam Ross, australiano que desenvolve programas de coquetel e ensina sobre coquetéis clássicos. Ross começou a trabalhar aos 15 anos, em um bar. Em 2001, ajudou a mãe e a irmã a abrir o próprio bar da família em Melbourne. Em 2004, mudou-se para Nova York. E em 2005, criou o coquetel, em homenagem ao músico de jazz Chet Baker.
Receita
CHET BAKER
Rafael Nardi
Ingredientes
- 60 ml de rum envelhecido
- 10 ml de vermute tinto
- 5 ml de xarope de mel
- 2 lances de bitter aromático
- Casca de laranja
Modo de Fazer
Chet Baker: Mexa os ingredientes com bastante gelo em um mixing glass (copo para preparo de drinks) por 30 segundos. Coe para um copo baixo com uma pedra grande de gelo. Perfume e decore com a casca de laranja.
Saiba mais
- Os principais apreciadores do rum não eram apenas os piratas do Caribe, mas também os homens da Marinha Real Britânica, que instituiu, em 1731, uma cota diária de rum da Jamaica para cada tripulante de seus navios, substituindo as cervejas. Principalmente porque era mais seguro consumir rum do que a água, que apodrecia nos barris nos navios.
- Conta a lenda que o corpo do importante nome da Marinha Britânica, Almirante Horatio Nelson, que morreu durante a Batalha de Trafalgar, teria sido levado de volta para o Reino Unido dentro de um barril de rum, para que se mantivesse conservado. E mais: os tripulantes do navio continuaram a beber aquele rum.
- O rum cubano tem algumas características particulares: deve ser produzido a partir de melaço ou caldo de cana cubano, sendo vetado o uso de matéria-prima de outros locais. Todo o rum é destilado em coluna, diferentemente do que ocorre em outros países do Caribe, o que resulta em 75% a 95% de pureza. E deve envelhecer por 3 anos.
Hashi Restaurante
Av. Mariland, 1.388 – 2º andar
De terça a sábado, das 19h às 23h
Fone: (51) 99919-6137
Rafael Nardi
@barmandeapartamento
Vinícius Santiago
@vinimirago